terça-feira, 23 de junho de 2009

A fábula no jornalismo brasileiro

“Vou tentar a vida como músico em Bremen. Venha comigo. Eu tocarei flauta e você poderá tocar tambor”. O convite do burro feito ao cão marca o início da mudança na vida dos protagonistas de Os Músicos de Bremen, fábula dos irmãos Grimm. Completo com a adesão do gato e do galo, o grupo, que na obra alegoriza a camada medieval oprimida, abandona seus donos – a classe aristocrata – e segue rumo à Bremen, no norte da Alemanha. Semelhante espírito de libertação se faz necessário tanto nos bastidores obscenos do jornalismo brasileiro, como também, e principalmente, na mentalidade dos espectadores da notícia.
A mudança na classe jornalística parece ser um obstáculo difícil de ser derrubado, embora não impossível. A descrença é explicada pelo conservadorismo da grande mídia, que, na prática, é quem realmente forma a opinião pública. As principais emissoras de televisão e a imprensa escrita popular continuam veiculando informações baseadas em seus interesses político-ideológicos e permanecerão agindo dessa maneira. Por isso, por incrível que possa parecer, é mais convincente acreditar em uma alteração no olhar do alvo da notícia, o espectador, assim como na fábula alemã quem se mobilizou foram os animais e não seus donos.
É essencial adquirir a noção de que a informação liberta, mas também oprime, dependendo do modo como é utilizada. À medida que ela se preocupa em noticiar a realidade, desprovida de sensacionalismos e com uma cobertura próxima da parcialidade, é possível agregar conhecimento e clareza sobre temas diversos. Entretanto, o tratamento do telespectador como robô, refém dos enlatados veiculados pela maioria dos telejornais brasileiros, é exemplo da opressão jornalística. É possível estabelecer, nesse momento, um diálogo com o filósofo Kant. As práticas sensacionalistas, tendenciosas e as meias-verdades ditas pelo jornalismo contrariam a noção do imperativo categórico, na medida em que negam princípios universais, bem como os ideais éticos coletivos.
O ideal seria a formação de um movimento simultâneo, tanto do jornalismo quanto do espectador. O primeiro, por meio das novas gerações de jornalistas, que precisam agir com lucidez e seguir o meio-termo proposto pela virtude aristotélica. Assim, devem ser perspicazes e audaciosas, mas honestas com a realidade. E o segundo, com a aquisição da liberdade e do discernimento e com a capacidade de uma interpretação própria dos fatos. O importante é avançar em vez de lamentar. Assim como fizeram os músicos de Bremen, cuja viagem se tornou o único fio condutor de suas vidas.


Lucas Martinez

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